Percival Puggina
Este artigo reproduz carta que enviei a um jovem. Por e-mail, ele
manifestara dissabor com o artigo “O vampiro argentino”. Bem educado, em
texto correto e movido por evidente boa intenção, ele expressou sua
contrariedade ante a referência que fiz ao fato de “jovens que não sabem
apontar com o nariz para que lado fica a Bolívia e que não conseguiriam
escrever meia página sobre os episódios de Cuba andarem pelas ruas
ostentando camisetas com a estampa do Che”. O meu leitor sabia as duas
coisas e se magoou.
Nas correspondências que trocamos, pedi a ele que em vez de apontar
para Bolívia, me indicasse suas razões para reverenciar a memória do
argentino. Respondeu-me ele que seu herói “renunciou às comodidades de
que desfrutava como médico, buscou viver e alcançar seus ideais, lutou e
deu a própria vida pelas suas convicções”. E acrescentou que se havia
algo que ele prezava e respeitava era “a coragem e a iniciativa de uma
pessoa”.
Imagino que esse leitor não seja o único que firma sua admiração a
Che Guevara nas mesmas bases. Eis, a seguir, o que lhe respondi.
Transcrevo na esperança de que sirva para outros em idêntica situação.
Caro jovem: as razões que apontas estão muito mais no plano da
reverência a certos sentimentos do que em fatos que os expressem de modo
louvável. Valorizaste a coragem, os ideais, a renúncia aos confortos e
bens materiais e à disposição de dar a vida por algo em que se crê. O
problema do Che não estava obviamente aí, mas no uso que fez desses
atributos de seu caráter.
Tua referência à renúncia aos bens materiais, aliás, me fez
lembrar o filme Diários de Motocicleta. Certamente o assististe. Nele, o
diretor Walter Salles Jr. comete amazônica injustiça contra as
religiosas que atendiam os índios no leprosário de San Pablo, no meio da
selva, dezenas de quilômetros a jusante de Iquitos. Che é apresentado
nas manipulações do filme como um anjo de bondade e as irmãs como
megeras. No entanto, aquelas mulheres passaram suas vidas inteiras
enfiadas em barracos de madeira, no meio do mato, cuidando de leprosos.
Não uma semana. Vida inteira! E não por ódio a alguém, mas por puro amor
ao próximo. Quem sabe passas a usar uma camiseta com a estampa das
irmãs de San Pablo?
E já que falei em cuidar de doentes, lembro outro caso. Em 1913, um
talentoso jovem alemão, com doutorado em filosofia, teologia, medicina e
música, exímio organista, considerado o maior intérprete de Bach em seu
tempo, muito bem sucedido profissionalmente, decidiu instalar por conta
própria um hospital às margens do rio Ogowe, no Gabão. Ergueu-o com as
próprias mãos. Como forma de mantê-lo, voltava periodicamente à Europa a
dar recitais. Fez isso não por uns dias, mas por toda a vida desde os
trinta anos.
Em 1953, sua contínua dedicação à tarefa que abraçou lhe valeu o
Prêmio Nobel da Paz. É dele esta frase que bem serviria para a reflexão
do vampiro argentino que se dizia sedento de sangue, médico como ele:
“Tudo que é vivo deseja viver. Nenhum sofrimento pode ser imposto sobre
as coisas vivas para satisfazer o desejo dos homens”. Quem sabe usas uma
camiseta com a estampa do pastor Dr. Albert Schweitzer?
A fuga de um prisioneiro do campo de Auschwitz, em 1941, levou o
comandante a sentenciar outros dez à morte por inanição. Entre os
escolhidos para cumprir a condenação havia um pai de família que muito
se lastimava pela orfandade que adviria aos filhos pequenos. Pois um
senhor polonês, de nome Maximiliano Kolbe, que estava preso por haver
dado fuga a mais de dois mil judeus, se apresentou para substituí-lo e
cumpriu a sentença que recaíra sobre seu companheiro de prisão. Com tão
justificado apreço pelos valores que apontas, por que não usas uma
camiseta com a estampa do padre Kolbe?
As pessoas que mencionei, meu jovem (e existem inúmeras assim!) superam
Che Guevara em tudo e por tudo. Exercitaram virtudes supremas sem
qualquer ódio. Deram quanto tinham, inclusive suas vidas inteiras a seus
ideais. Che fez isso? Fez. Mas, se colocou a própria vida em risco,
como de fato podia fazer em nome de seus ideais, achou-se no direito de,
pelo mesmo motivo, tomar a vida dos outros. E tal direito ele não
tinha. Isso é muito diferente e satanicamente pior! O resultado dos
exemplos que citei foram vidas salvas. O resultado da obra de Che foram
vidas tomadas, sangue derramado, e liberdades extintas.
Cordial abraço,
Puggina.
Agora, escrevo a quem me lê aqui: mesmo diante do que acabo de expor,
muitos persistirão achando Che Guevara o máximo. Mas estão forçados a
admitir que é na revolução, na luta de classes, na tomada do poder pelas
armas e no comunismo que repousam seus apreços. E nesse caso me
permitam afirmar que camisetas do Che são tão ofensivas e ameaçadoras,
quando portadas num país livre e democrático, quanto a suástica, a foice
com martelo, ou a cruz flamejante da KKK.
(TRIBUNA DA IMPRENSA)
WOWS! É preciso coragem para desmascarar um mito. Me motivou a saber mais...
ResponderExcluirJOPZ
Além de ser um assassino cruel não gostava do liquido precioso. Sendo que seu apelido era porco fedorento. A maioria dos jovens que andam com a cara deste facinara estampada na sua camiseta não conhece a verdadeira historia deste pseudo heroi da liberdade. Ele nunca defendeu a liberdade ele defendeu sempre o comunismo e a opressão.
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